Jó 3: O Cristão e a Depressão
- Pastor Alex Daher

- há 2 dias
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Atualizado: há 1 dia
Série em Jó: Sofrimento Soberano 16 de Novembro de 2025 – IBJM
Nos últimos 3 domingos, nós cantamos um hino que começa assim:
Misteriosos feitos são as obras do meu Deus
Caminha sobre o temporal, o vento e o mar são Seus
Está no oculto a trabalhar, mui hábil sem falhar
Os Seus desígnios faz valer, quão grande é Seu poder.
Esse hino foi escrito 250 anos atrás – em 1774! – por um homem que viveu na Inglaterra chamado William Cowper. A vida desse homem é um lembrete de como as obras do nosso Deus são realmente misteriosos feitos; de como Deus “está no oculto a trabalhar, mui hábil sem falhar”.
William Cowper lutou praticamente a vida toda contra o desespero e a depressão. Quando ele tinha 6 anos, a mãe dele morreu. No tempo de escola, alguns colegas eram cruéis e o tratavam muito mal. Ele foi noivo por 2 anos, mas o pai da noiva proibiu eles de se casarem.
O pai dele era rico e queria que ele fosse um advogado, mas o William Cowper nunca levou a carreira a sério. Ele estava mais interessado em “aproveitar” a vida. Quando ele tinha 32 anos, ele conseguiu uma vaga para se tornar o Escrivão no Parlamento da Inglaterra. Muitas pessoas veriam como uma excelente oportunidade na carreira, mas o William Cowper viu como uma tortura. Não era a vida que ele queria.
Ele teve, então, o que um autor chamou de “colapso psicótico”. Ele entrou em um estado de desespero incontrolável. Ele tentou se matar 3 vezes, até que ele foi internado em um hospício—o que hoje nós chamaríamos de hospital psiquiátrico.
As obras do nosso Deus são realmente misteriosas. Na providência do Senhor, o dono do hospital psiquiátrico era um médico de 58 anos... e crente. Um crente fiel.
O William Cowper lutava com culpa por ter tentado tirar a vida, mas esse médico crente abençoado não desistiu de dar esperança para ele. Até que um dia, depois de 6 meses no hospital, lendo Romanos 3, o William Cowper disse o seguinte:
Imediatamente recebi força para crer, e os raios do Sol da Justiça brilharam sobre mim. Vi a suficiência da expiação que [Jesus] havia feito, meu perdão selado no sangue dele e toda a plenitude… da justificação dele. Num instante, eu cri e recebi o evangelho. [...] Se o braço do Todo-Poderoso não estivesse me segurando, creio que teria morrido de [tanta] gratidão e alegria. (William Cowper e o Século XVIII, 132).
Agora está tudo resolvido, certo!? Chega de desespero. Agora ele se converteu! Agora ele foi salvo. Cheio de gratidão e alegria que não consegue nem ficar em pé. Agora ele nunca mais vai se sentir daquele jeito horrível.
Nem tanto. William Cowper passou por mais alguns momentos de intensa escuridão na alma. Ele tentou tirar a vida, de novo, algumas vezes. Ele teve crises sérias de depressão. Um pouco antes de ele morrer, em 1800, ele estava de novo muito mal, em uma quase completa falta de esperança.
Povo de Deus, uma das lições mais importantes desse capítulo de Jó é: cristãos também ficam deprimidos. Cristãos verdadeiros passam por seus momentos de desespero.
William Cowper era um cristão verdadeiro, compôs hinos cristãos lindos, e lutou com depressão. Jó era um cristão verdadeiro—um adorador do Deus vivo—e ainda assim lutou com grande agonia no seu espírito.
Que Jó é um crente verdadeiro, nós não temos dúvida. O livro de Jó começa dizendo:
Jó 1:1—Havia um homem na terra de Uz cujo nome era Jó. Este homem era íntegro e reto, temia a Deus e se desviava do mal.
E caso nós tenhamos lido muito rápido, logo depois Deus fala para Satanás para a mesma coisa, e no capítulo 2 Deus fala para Satanás a mesma coisa.
Três vezes nós lemos: Jó é um homem íntegro e reto, que teme a Deus e se desvia do mal (1:1, 1:8, 2:3).
Esse é o jeito hebraico de sublinhar o texto, colocar em negrito, passar aquela canela amarela para destacar. Eles repetem. Jó é um cristão e Jó está lutando contra o desespero. Como nós vamos ver, Jó não está nada bem.
Eu vou dividir esse sermão em duas partes, ou duas etapas:
• Primeiro, vamos nos sentar no chão junto com Jó e seus amigos e ouvir Jó. Vamos ouvir o lamento dele e observar o que está acontecendo com nosso irmão na fé Jó.
• Depois, vamos nos levantar do chão e pensar no que Deus está nos ensinando com a agonia intensa de Jó. Neste ponto, eu gostaria de fazer alguns comentários pastorais.
Eu não tenho a pretensão de lidar com todas as questões possíveis sobre o cristão e a depressão. Mas com a ajuda do Senhor, eu quero fazer alguns comentários que possam nos ajudar a lidar com a nossa própria tristeza e nos ajudar a lidar com nossos irmãos deprimidos.
PRIMEIRO, VAMOS OUVIR JÓ:
Vamos nos sentar no chão com Jó. Nessa etapa eu vou me concentrar mais em tentar explicar o texto e o que está acontecendo com Jó. E na segunda etapa, nós aplicamos a nós.
O capítulo 2 terminou com Jó e seus amigos com as roupas rasgadas, jogando terra para o ar e sem saberem o que dizer para um homem que perdeu tudo.
Jó 2:13—Sentaram-se com ele no chão durante sete dias e sete noites. E ninguém lhe disse uma só palavra, pois viam que a dor era muito grande.
O capítulo 3 começa com Jó quebrando o silêncio. Depois de uma semana de jejum de palavras, Jó fala.
[1] Depois disto, Jó passou a falar e amaldiçoou o dia do seu nascimento. [2] Jó disse:
1. QUE MORRA O DIA EM QUE EU NASCI! (VV. 3-10)
Jó não está bem. Ele queria nunca ter nascido:
[3] Pereça o dia em que nasci e a noite em que se disse: ‘Foi concebido um homem!’
Jó não está bem. A primeira frase que sai da boca dele é: “Morra o dia em que eu nasci”. Para passar o que ele está passando, ele preferia nunca ter existido.
Ele pega o dia do nascimento dele na mão e ataca esse dia verbalmente, sem parar, usando imagens de trevas, morte e escuridão:
[4] Que aquele dia se transforme em trevas (...)
[5] Que as trevas e a sombra da morte se apoderem desse dia; (...)
Ele faz a mesma coisa com a noite em que ele foi concebido:
[6] Aquela noite, que dela se apoderem densas trevas; (...)
[7] Sim, que seja estéril aquela noite,
Na criação, havia trevas sobre a face do abismo e Deus disse: “Haja luz!” e houve luz. E Deus viu que a luz era boa e fez separação entre a luz e as trevas (Gênesis 1:2-4).
Jó está dizendo: “Eu queria que o meu dia fosse ‘descriado’”. Eu queria que Deus voltasse no tempo, e que ele olhasse para o dia do meu nascimento e dissesse: “Haja trevas!” para que eu nunca tivesse nascido.
No versículo 8 ele usa explicitamente a linguagem de maldição:
[8] Amaldiçoem-na [a noite] aqueles que sabem amaldiçoar o dia e sabem instigar o Leviatã.
Jó não amaldiçoa a Deus, como Satanás queria e como a esposa dele aconselhou ele a fazer. Mas Jó amaldiçoa. Ele pede para Deus matar o dia em que ele nasceu.
Leviatã vai voltar no capítulo 41. Leviatã é o monstro marinho que representa as forças do caos e do mal nesse mundo (Belcher, Job, 34). A missão do Leviatã é destruir a ordem e a beleza do mundo que Deus criou (Ash, Trusting God, 38).
Jó está criando uma imagem de pessoas que podem assobiar e chamar o Leviatã—como um dragão do mal—para destruir o que estiver pela frente. “Vocês que sabem instigar o Leviatã, por favor, chamem a ele e peçam para ele cuspir fogo no meu dia do nascimento”.
Por que Jó está falando desse jeito? Nós temos uma pista no versículo 10:
[10] pois não fechou as portas do ventre da minha mãe,
nem escondeu dos meus olhos o sofrimento.
Jó está cansado de sofrer. Já deu.
“Agora já está bom. Eu quero a minha vida de volta”.
Jó cansou.
Você já sentiu esse tipo de cansaço? Não é um cansaço físico. É um cansaço emocional, mental, espiritual.
A provação, por si só, já é um desafio enorme. Mas quando a provação se prolonga, você cansa.
Esse desejo por descanso fica ainda mais claro na continuação do lamento de Jó. Do versículo 3 ao 10, Jó desejou que ele nunca tivesse nascido. Mas já que ele nasceu, agora ele deseja ter morrido assim ele nasceu:
2. POR QUE EU NÃO MORRI QUANDO NASCI? (VV. 11-19)
[11] Por que não morri ao nascer?
Por que não expirei ao sair do ventre de minha mãe?
[12] Por que houve um colo que me acolhesse,
e seios, para que eu mamasse?
As perguntas do tipo “por quê?” começaram. Elas não apareceram no capítulo 1 nem no capítulo 2, mas uma hora elas acabam brotando na nossa mente. Conforme nós ficamos pensando no nosso sofrimento, passando o filme do que aconteceu (ou o que poderia ter acontecido), nascem os “por quês”?
“Por que isso está acontecendo? Por que eu preciso passar por isso? Por que Deus está permitindo isso?”
As perguntas do tipo “por quê?” são sempre perguntas religiosas.
As perguntas do tipo “por quê?” são sempre perguntas teológicas.
Perguntas que tem a ver com Deus. “Por que isso, Deus?”
Jó vai abrir ainda mais o coração dele agora. No versículo 10 estava implícito. Agora fica explícito o que Jó está desejando. Ele quer descanso.
[13] Porque agora eu repousaria tranquilo; dormiria, e então haveria para mim descanso, (...)
[17] Ali os maus cessam de perturbar, e ali repousam os cansados.
[18] Ali os presos juntamente repousam e não ouvem a voz do capataz.
[19] Ali está tanto o pequeno como o grande, e o servo fica livre [descanso] de seu senhor.
Jó chegou no ponto em que ele vê a morte como um alívio. Esse é o tipo de pensamento de uma pessoa que está desesperada, deprimida, sem esperança.
• No versículo 14 e 15 ele fala da morte como o lugar onde os poderosos descansam.
• No versículo 16 até o 19, ele fala das crianças, dos presos e dos servos repousando quando morrem.
“Tanto o pequeno” (crianças e servos) “como o grande” (reis e senhores), todos eles estão livres da agonia dessa vida. É para esse lugar de descanso que Jó quer ir.
Jó não tem pensamentos suicidas. Ele não está planejando tirar a própria vida. Mas ele está pronto para Deus levá-lo. De preferência, o quanto antes.
No capítulo 7, ele chega a dizer:
Por isso, prefiro ser estrangulado; antes a morte do que esta tortura. Estou farto da minha vida; não quero viver para sempre. Deixa-me em paz, porque os meus dias são um sopro (Jó 7:15-16).
Jó sabe que somente Deus tem o direito de dar vida e o direito de tomar vida. Mas ele não aguenta essa vida.
Pense na morte como um homem encapuzado com uma foice na mão montado em um cavalo preto enorme.
• Na primeira parte do lamento (do versículo 3 a 10), ele queria que o cavaleiro da morte levasse a ele antes de ele nascer.
• Como não aconteceu, na segunda parte do lamento (do versículo 11 ao 19), ele queria que o cavaleiro da morte levasse a ele assim que ele nasceu.
• Como não aconteceu, na terceira parte do lamento (do versículo 20 ao fim), ele queria que o cavaleiro da morte levasse a ele antes de isso tudo acontecer.
3. POR QUE EU NÃO MORRI ANTES? (VV. 20-26)
Ele começa com mais um “por quê?”
[20] “Por que se concede luz ao miserável [como ele se sente]
e vida aos de coração amargurado [como ele se sente],
[21] que esperam a morte, e ela não vem,
que cavam em procura dela mais do que tesouros ocultos,
[22] que se alegrariam por um túmulo
e exultariam se achassem a sepultura?
Parece que a esperança se Jó morreu. No versículo 21, ele fala da morte como um tesouro oculto que deve ser desejado e buscado. No versículo 22, ele vê o túmulo como algo que vai finalmente dar alegria a ele.
O desespero bagunça os nossos pensamentos. As coisas ficam fora de ordem. Tudo fica embaçado. Uma pessoa deprimida não consegue ver direito a vida. As coisas parecem não fazer sentido.
As coisas não estão mais claras como antes: quem sou eu? O que eu estou fazendo aqui? E, o que deixa nossa mente mais confusa: quem Deus é? Por que ele está fazendo isso comigo?
Jó está tão mal, tão angustiado, tão deprimido—que ele parece estar vendo Deus como alguém que está contra ele.
[23] Por que se concede luz ao homem cujo caminho é oculto,
e a quem Deus cercou de todos os lados?”
No capítulo 1, Satanás disse que Jó adorava a Deus só porque Deus colocou uma cerca ao redor dele—protegendo Jó. Mas agora, a cerca que Jó vê em volta dele não é uma cerca para protegê-lo. É uma cerca para prendê-lo—para impedir que ele saia e se livre do sofrimento. Jó quer descanso, ele quer respirar, mas Deus não deixa a ele sair.
A depressão bagunça os nossos pensamentos. Uma angústia profunda faz você olhar para a morte como alguém que está a seu favor e a olhar para Deus como alguém que está contra você. A depressão tem força para chacoalhar nossa mente de um jeito que tudo fica fora do lugar. A vida perde as cores e os sabores. Tudo fica cinza. E sem sentido.
Jó termina o lamento dele falando de novo do que ele mais quer. E para gravar na nossa mente (e na mente dos amigos dele que estão sentados no chão e ouvindo), ele repete 4 vezes o que ele quer:
[26] Não tenho descanso, não tenho sossego, não tenho repouso; só tenho inquietação.
A mente de Jó está fixada em um desejo: descanso. Sossego. Ele só quer paz. Dá para entender. Olha o que esse homem sofreu! Ele está cansado de toda essa luta.
Mas o que aconteceu com o Jó do capítulo 1 e 2? Que Jó é esse do capítulo 3? É a mesma pessoa? Ele parecia tão firme no Senhor. A fé de Jó parecia tão indestrutível. O que aconteceu?
No capítulo 1, Jó perdeu todos os bens e todos os filhos e ele disse:
Nu saí do ventre de minha mãe e nu voltarei. O Senhor o deu e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor (Jó 1:21)!
No capítulo 2, Jó ficou coberto com tumores malignos da planta do pé ao alto da cabeça. E como ele respondeu?
Temos recebido de Deus o bem; por que não receberíamos também o mal (Jó 2:10)?
O que aconteceu entre o capítulo 2 e o capítulo 3? O que esses 7 dias e 7 noites em silêncio fizeram com Jó? Nós vamos explorar mais essa mudança em Jó, mas a minha resposta curta para essa pergunta é: Jó também é pó. Jó é pó. Como nós. A Bíblia só tem um herói. O nome dele também começa com J, mas não é Jó.
Eu não sei, talvez você se identifique mais com o Jó do capítulo 3 do que o Jó do capítulo 1 e 2. Você quer ser como o Jó do capítulo 1 e 2. Esse é o seu desejo! O Senhor faz você passar por uma grande provação e você quer dizer: “bendito seja o nome do Senhor!”. E você diz, às vezes. Mas às vezes, dependendo da provação, e da duração da provação, você também precisa lidar com pensamentos do tipo:
“Senhor, se é para viver assim, eu não quero”. “Senhor, eu estou cansado dessa situação! Senhor, quando isso vai terminar!? Senhor, por quê?”
Com a ajuda do Senhor, você pode responder como Jó no capítulo 1 e 2. Mas dependendo da força do golpe que você levou (ou está levando!) da providência de Deus, dependendo do tamanho da dor, você precisará lutar contra o desespero, a depressão, a falta de esperança nessa vida. Nenhum de nós está livre disso nesse mundo.
Chegou a hora de nos levantarmos do chão. Depois de observar Jó, eu gostaria de fazer alguns comentários pastorais que, eu espero, possam nos ajudar a lidar com a agonia na nossa alma e na alma dos nossos irmãos.
SEGUNDO, CINCO COMENTÁRIOS PASTORAIS:
Meu primeiro comentário é uma repetição do que já falei. Eu estou imitando Jó e os judeus e repetindo para não nos esquecermos:
1. CRISTÃOS TAMBÉM FICAM DEPRIMIDOS
Cristãos verdadeiros também passam pelas noites escuras da alma. Jó é um crente verdadeiro e teve que lutar contra o desespero. William Cowper é um crente verdadeiro e teve que lutar contra a depressão. Um cristão genuíno pode ter lutas intensas contra a falta de esperança.
Ouça o profeta Jeremias no texto que nós ouvimos durante o culto:
Lamentações 3:17-18—Já não sei o que é ter paz e esqueci o que é desfrutar do bem. Então eu disse: “Não tenho mais forças. A minha esperança no Senhor acabou.”
Não são só os profetas. Os reis também choram. Não é verdade que em boa parte dos salmos, as folhas estão molhadas com as lágrimas de Davi, enquanto ele escrevia suas orações a Deus?
Eu preciso dar um último exemplo: Robert Somerville. Você provavelmente não conhece a ele. Deixe-me dar o currículo dele: Pastor por mais de 30 anos. Doutorado na área de Aconselhamento Bíblico. Professor de Aconselhamento Bíblico no Seminário que o John MacArthur fundou. Começou um ministério de Aconselhamento Bíblico para equipar as pessoas da igreja para aconselhar outros.
Esse homem está protegido, certo? Existe uma cerca ao redor dele que impede que a depressão entre, certo? Não. Ele ficou muito mal. Insônia, perda de peso, pensamentos suicidas, falta de esperança.
Por que eu quero convencer todos nós que os cristãos também têm depressão?
Primeiro, se acontecer com você, não pense que algo estranho está acontecendo. Um dos pensamentos que os cristãos têm quando estão nesse estado é: será que eu realmente sou salvo? Se eu sou cristão, eu não deveria estar bem?
Cristãos deprimidos se sentem culpados por estarem mal. Eles não queriam estar daquele jeito, mas eles estão. Por isso, se lembrar que homens e mulheres de Deus já passaram pela sua experiência antes de você, pode ser uma das verdades que o Senhor irá usar para sustentar seu espírito. E, no tempo dele, devolver a você a alegria da sua salvação.
Segundo, se acontecer com um cristão do seu lado, com seu marido ou esposa ou filhos, você estará mais bem preparado para ajudar se você estiver convencido de que crentes também lutam contra o desespero. Você não precisa se desesperar também.
Hoje em dia existe uma versão da fé cristã sendo promovida que eu chamaria de “Cristianismo Oba-Oba”. “Tudo vai dar certo! Deus nos fez para ser cabeça, não calda, meu irmão”. “É só vitória, varão”.
A história da igreja por milhares de anos mostra uma realidade diferente.
A Palavra de Deus nos mostra uma realidade diferente.
Cristão também tem depressão. Há esperança, sim. Mas nesta vida, alguns de nós passam por momentos de intensa agonia.
Meu segundo comentário pastoral:
2. PARA AJUDARMOS OS OUTROS, NÓS PRECISAMOS DE COMPAIXÃO
Nós seremos mais úteis na vida das pessoas se nós entrarmos com elas no sofrimento delas. Se você está em uma posição de ajudar alguém que está mal, tome tempo para ouvir e se colocar na situação do seu irmão ou da sua irmã que está sofrendo.
E se fosse eu que tivesse perdido um filho? E se fosse o meu pai que estivesse muito doente? E se eu estivesse com essa dor? E se fosse eu que ficasse desempregado tanto tempo? E se tivessem feito essa injustiça comigo? E se tivessem pecado assim contra mim? E se fosse comigo?
Tome tempo para a sua alma se unir a dor do outro.
Esse exercício nos ajuda a amolecer a nossa alma.
“Mas eu tenho que sofrer por causa do sofrimento do outro?” Exatamente. Não foi isso que o Senhor Jesus fez por nós de uma maneira suprema na cruz?
Agora ele chama você a sofrer com os que sofrem. A chorar com os que choram (Romanos 12:15), como Jesus fez com as irmãs de Lázaro quando ele morreu. Um dos versículos mais curtos e mais profundos de toda a Bíblia: João 11:35 – “Jesus chorou”.
Esse mundo é tão duro, tão seco, tão frio. Demonstrar amor e compaixão com alguém que está mal é um passo fundamental na direção do amor.
William Cowper lutou quase a vida inteira contra a depressão, mas ele não lutou sozinho. Deus deu a ele um companheiro de batalha chamado John Newton. O mesmo John Newton que escreveu o famoso hino Maravilhosa Graça—Amazing Grace.
John Newton era um comerciante de escravos, mas depois da conversão dele, ele se tornou a compaixão em carne e osso. Ouça o que o William Cowper disse depois de ter passado um tempo com John Newton.
Em sua visita, eu encontrei parte do conforto que tem adoçado nossos encontros... Eu reconheci você como aquele mesmo pastor que foi enviado para me guiar do deserto para o pasto onde o Supremo Pastor (Jesus) apascenta o rebanho dele. Meus sentimentos de amizade afetuosa por você são os mesmos de sempre. (Fonte: https://www.desiringgod.org/articles/depression-fought-hard-to-have-him)
Que amizade espiritual maravilhosa. Que o Senhor envie você e muitos outros John Newton para levar ovelhas deprimidas de volta para o pasto do Supremo Pastor Jesus. Esse é a nossa principal função para ajudar aqueles que querem descanso, sossego, repouso e paz.
E se você não está bem, se você sente que não consegue ir sozinho para repousar nos pastos verdejantes e nas águas de descanso, peça ajuda. A depressão (o desespero) tem um efeito paralisante. É difícil tomar uma decisão. É difícil pensar direito. Para isso o Senhor nos deu o povo dele.
Esse é um ponto positivo de Jó neste lamento. Ele está sendo honesto. Ele está abrindo o coração—tanto para Deus quanto para seus amigos.
Você não precisa falar tudo para todo mundo. Mas você precisa se abrir com alguém. Com alguns irmãos ou irmãs que vão ajudar você. Orar com você. Sofrer com você. Ajudar você a chegar de novo até o seu Salvador compassivo.
Terceiro comentário pastoral:
3. GERALMENTE, A DEPRESSÃO ESTÁ RELACIONADA A ANSIEDADE E A FRUSTRAÇÃO
Essa verdade nos ajuda a fazermos boas perguntas para nós mesmos (e, com amor, para os nossos irmãos) que nos ajudam a entender por que minha esperança está secando.
Geralmente, a falta de esperança (a depressão) começa em dois lugares: na frustração ou na ansiedade. Em outras palavras, a depressão espiritual é uma consequência da minha raiva ou do meu medo.
Vamos ouvir Jó de novo. Primeiro, veja a frustração de Jó:
[3] Pereça (morra!) o dia em que nasci...
[11] Por que não morri ao nascer?
Quem está bem, não fala desse jeito. Jó quer descanso, mas o Senhor não está dando. Como um conselheiro bíblico chamado Jim Berg disse, a raiva vem do pensamento: “Eu estou assim porque eu não tenho o que eu preciso”.
Jó quer descanso. Claro, esse desejo dele é um bom desejo. E quem de nós irá culpar Jó? Não é um desejo razoável!? Nós devemos ter compaixão de Jó. Ele está sofrendo muito.
Mas a maneira como ele está respondendo agora é diferente do capítulo 1 e 2. Agora ele não está confiando. Ele não aguenta mais esperar no Senhor. Agora ele está se revoltando.
A segunda fonte de desespero—da depressão espiritual—é a ansiedade (o medo). Se pensamentos do tipo “E se eu não conseguir o que eu quero?” me dominam e habitam na minha mente tempo suficiente, o próximo passo é: “Eu nunca vou conseguir o que eu quero. E minha esperança morre e a depressão nasce.
Veja como Jó precisa lutar contra o medo:
[25] Aquilo que temo me sobrevém,
e o que receio me acontece.
Jó está experimentando também temor, receio, medo, uma preocupação que está controlando a ele.
O medo (a incerteza) de que alguma coisa ruim vai acontecer pode evoluir para a certeza de que ela vai acontecer. E quando vem essa certeza de que “eu nunca vou conseguir o que eu quero” se instala na nossa alma, nossa esperança acaba. E nós entramos em um estado de desespero e depressão.
A falta de esperança nos impede de olhar para frente com confiança em Deus. Vocês repararam como Jó só olha para o passado e lamenta? A depressão nos prende no passado. E quando nós olhamos para o futuro, nós só vemos escuridão.
Saber que geralmente existe um relação entre a depressão e essas outras duas emoções – o medo e a frustração – nos ajuda a fazermos as perguntas certas ao coração. Isso me leva ao meu quarto comentário pastoral:
4. LEMBRE-SE QUE O PRINCIPAL CAMPO DE BATALHA NA DEPRESSÃO É O CORAÇÃO
Provérbios 4:23—De tudo o que se deve guardar, guarde bem o seu coração, porque dele procedem as fontes da vida.
Na Bíblia, o coração é o centro do seu ser: o que você pensa, o que você deseja, seus sonhos e medos e esperanças—eles são controlados pelo seu coração.
Por isso, o coração (os pensamentos) é onde a batalha contra a falta de esperança é travada. Em outras palavras, o meu desespero é fruto do que meus pensamentos. O grande campo de batalha na depressão é coração.
Nós somos afetados pelas circunstâncias—como Jó ter perdido todos os bens e todos os filhos, nós somos afetados pela dor em nosso corpo—como os tumores malignos de Jó, e algum fator físico pode contribuir para o nosso estado prostrado, mas a reação de Jó vem do coração de Jó—dos pensamentos que habitam na mente de Jó.
Veja o que está acontecendo com nosso irmão amado Jó:
• No capítulo 1, em um versículo, Jó falou três vezes o nome do Senhor: “O Senhor o deu e o Senhor o tomou, bendito seja o nome do Senhor!”
• No capítulo 2, em um versículo, Jó falou o nome de Deus com confiança: “Temos recebido de Deus o bem; por que não receberíamos o mal?”
Mas depois de 1 semana, os pensamentos de Jó estão menos cheio de Deus. Nos 26 versículos do capítulo 3, as únicas duas vezes que ele fala de Deus, ele não fala de forma positiva: uma vez ele deseja que Deus não se importe com o dia do nascimento dele (v. 4) e na segunda vez ele fala de Deus com alguém que está cercando ele com sofrimento (v. 23).
Jó está pensando menos em Deus e mais concentrado nele mesmo. Veja como o final do lamento dele está cheio de “eu”, mas vazio de “Deus”.
[25] Aquilo que [eu] temo me sobrevém,
e o que [eu] receio me acontece.
[26] [Eu] Não tenho descanso,
[eu] não tenho sossego,
[eu] não tenho repouso;
[eu] só tenho inquietação.
Essa é uma das explicações mais fundamentais para a nossa perda de esperança: nós estamos olhando para o lugar errado. Nós estamos olhando muito para nós mesmos. Nós estamos colocando nossa esperança em que uma situação irá mudar ou uma pessoa irá mudar. Nós precisamos falar com a nossa alma para olhar para o lugar certo—olhar para a Pessoa que nunca vai mudar: o Deus da esperança.
FALE COM SUA ALMA
Martyn Lloyd-Jones, um pastor do Reino Unido, no livro Depressão Espiritual, disse uma verdade poderosa e transformadora. Em um trecho do livro, ele pergunta:
Você já percebeu que a maior parte de sua infelicidade na vida acontece porque você está ouvindo a você mesmo em vez de falar para você mesmo?
Como isso é verdade!
Meus piores momentos—meus momentos de maior desencorajamento—acontecem quando meus pensamentos excluem Deus e as promessas de amor dele em Cristo e o céu e o perdão dos pecados e eu fico centrado na minha situação e em mim.
Meus piores momentos—os momentos em que a tristeza espiritual me domina—são aqueles em que eu fico passivo, escutando meus pensamentos.
Com outras pessoas, esteja pronto para ouvir e seja tardio em falar. Mas com a sua alma, nós devemos interromper mais: interromper pensamentos que só falam de mim e não falam daquele que morreu por mim.
Foi o que Rei Davi fez. Ele falou com ele mesmo no Salmo 62:
Somente em Deus, ó minha alma, espere silenciosa, porque dele vem a minha esperança (v 5).
É assim que Davi lutou contra o desespero. Mas Jó ainda não está conseguindo fazer isso. Ele precisa de ajuda.
Mas com a ajuda de Deus – usando a Palavra de Deus, no meio do povo de Deus e com orações a Deus – nós podemos mudar nosso modo de pensar. E nós podemos colocar nossa esperança na Pessoa que nunca vai mudar: nosso Deus.
PROCESSO, NÃO EVENTO
Deus tem poder para ressuscitar a esperança dos deprimidos, assim como ele ressuscitou o Filho dele.
Dependendo do quanto você afundou, para você ser retirado da lama, leva tempo. Dependendo da força do golpe da providência e do tamanho do corte na alma, leva tempo para cicatrizar. Em vez de enxergar nossa saída do desespero como um único evento que resolverá tudo para sempre, é melhor pensar em um processo.
Com alguns, pode ser mais rápido—semanas. Com outros, pode ser mais lento—meses, anos. Mas é melhor ver sua recuperação como um processo. Um processo que um dia vai terminar. Nem que seja, como no caso do William Cowper, diante de Deus nos céus.
Aqui vai meu último Comentário Pastoral:
5. EXISTE ESPERANÇA
Eu coloquei como o último comentário pastoral, mas essa é a primeira coisa que nós precisamos quando estamos aflitos, desesperados e deprimidos. Nós precisamos de esperança.
Esperança é o oxigênio da alma. Esperança é o que nós precisamos respirar para continuar vivendo. Jó está mal desse jeito, não querendo mais viver, porque a esperança dele morreu.
Eu fiquei pensando: e se eu tivesse 5 minutos com Jó, o que eu falaria para ele? Se eu tivesse Jó aqui na IBJM e pudesse conversar um pouco com ele depois do culto, o que eu falaria para Jó? Como eu tentaria amar meu amigo Jó?
Quando alguém está tão mal assim, geralmente essa pessoa precisa de alguém para caminhar junto por meses, não minutos. Mas nas mãos do Senhor, nenhum minuto é desperdiçado. Ele pode usar a Palavra dele com poder e nos erguer do lamaçal mais rápido do que nós imaginamos.
Eu acho que eu faria o seguinte. Eu começaria dizendo algo breve como:
Jó, que bom que você veio ao culto hoje. Eu quero agradecer você pode ter aceitado conversar comigo. Vamos começar nosso tempo orando e pedindo sabedoria do Senhor?
Jó provavelmente concordaria com a cabeça, sem falar nada. Os olhos dele provavelmente estariam cheios de água, quase chorando. Eu faria uma breve oração com Jó.
Senhor, obrigado por trazer meu amigo Jó até aqui. Obrigado por tudo o que o Senhor é para nós: nosso Deus soberano. nosso Deus bondoso. Jó tem passado por um tempo tão difícil. Ele está sofrendo muito. Por favor, Senhor, sustenta a fé do meu amigo. Não deixa ele tirar os olhos do nosso Senhor Jesus, que tanto nos amou naquela cruz. Senhor, usa a tua Palavra na vida de Jó. Sopra esperança no coração dele. No nome de Jesus, amém.
O ideal seria não ter 5 minutos, mas ter 5 horas com Jó. Deixar Jó falar e contar como ele está se sentindo. O que ele tem pensado. Deixar ele falar bastante. Fazer uma ou outra pergunta, mas deixar ele falar.
Mas vocês só me deram 5 minutos. E eu já usei uma parte do meu tempo orando—o que é fundamental. Então, eu acho que eu diria para Jó alguma coisa assim:
Jó, eu lamento muito o que você está passando, meu amigo amado. Eu estou muito triste com tudo o que aconteceu com você. Jó, eu li a oração que você escreveu no capítulo 3 do seu livro. Muito obrigado por ser honesto e falar o que está no seu coração. Deve estar sendo muito difícil ter que lidar com tudo isso. Eu vou continuar orando para o Senhor dar a você descanso, como você escreveu no final.
Eu posso falar uma coisa para você? (Ele provavelmente ia balançar a cabeça de novo, concordando).
Jó, eu li também o que você escreveu no capítulo 19 do seu livro. Você lembra? Você escreveu:
Porque eu sei que o meu Redentor vive e por fim se levantará sobre a terra. Depois, revestido este meu corpo da minha pele, em minha carne verei a Deus. Eu o verei por mim mesmo, os meus olhos o verão, e não outros; de saudade o meu coração desfalece dentro de mim (Jó 19:25-27).
Jó, você lembra do que você escreveu? Não vamos desistir, meu amigo.
Você disse: “eu sei que o meu Redentor vive”. Isso é verdade, Jó.
Você disse: “os meus olhos verão a Deus”. Isso é verdade, Jó.
Traga à sua mente o que pode trazer esperança para você. Tente não ficar alimentando pensamentos que alimentam seu desespero. Troque esses pensamentos pelas verdades que você conhecem sobre o seu Deus. Eu sei que você crê que seu Deus é soberano e bom e cheio de amor. Eu sei que você confia no Senhor.
Jó, existe esperança. Você sabe, um dia antes da cruz, no Jardim do Getsêmani, Jesus também estava com 3 amigos, como você. Ele ficou prostrado no chão também, como você. Ele passou por uma enorme agonia da alma, como você. Ele chegou a dizer: “—A minha alma está profundamente triste até a morte”. Ele se sentiu sozinho, como você está se sentindo.
Jó, você sabe: na cruz, no dia seguinte, a agonia dele foi ainda maior. A escuridão da alma que ele enfrentou foi ainda maior. Ele chegou a clamar: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Ash, Trusting God, 43).
Jó, você sabe: o nosso Redentor morreu e ressuscitou. Ele venceu a morte.
Na cruz, ele derrotou Satanás, o nosso Acusador.
Na cruz, ele pagou pelos nossos pecados contra Deus.
Na cruz, ele comprou com o sangue dele, Jó, o seu direito de viver com Deus.
Jó, você não está sozinho. Deus não vai abandonar você. Por causa de Jesus, existe esperança, Jó.
CONCLUSÃO
Eu não sei como ele reagiria. Mas sei que nós não podemos desistir de oferecer esperança para os nossos irmãos e para a nossa alma.
Se você tem alguém perto de você que está sem esperança, continue falando para ele sobre Jesus. Sobre o amor de Jesus, sobre a compaixão de Jesus, sobre a vitória dele sobre o sofrimento e o pecado e todo o mal naquela cruz. Continue falando sobre o céu e como um dia esse irmão (essa irmã) verá Jesus com os próprios olhos.
Se você é quem está deprimido: continue falando para você mesmo sobre Jesus. Sobre o amor de Jesus, sobre a compaixão de Jesus, sobre a vitória dele sobre o sofrimento e o pecado e todo o mal naquela cruz. Continue falando para você sobre o céu e o dia em você verá a Jesus com seus próprios olhos.
No tempo de Deus, a luz da esperança em Cristo vai raiar de novo na sua escuridão.
Fontes da História de William Cowper:
Ash, Trusting God in the Darkness, 32-33.
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